sexta-feira, maio 26, 2006

A segunda história roubada

A praia está encoberta por um edifício de vidros baços. As minhas folhas estão encobertas por uma fina camada de falta de vontade. Ao longe, miúdos desafiam a gravidade equilibrados no vazio das ondas. Pego na primeira folha... as letras adensam-se perante a inércia leve do ar. Chopin... só uma vez prometo a mim mesma. Abro a caixinha de música e deixo o Nocturno nº 15 encostar-se à minha pele. Deixo-me levar pela brisa de maresia e sol para um outro lugar também leve, também meu.

Aquele lugar

Aquele lugar
Onde a alma se despede do corpo
E as lágrimas se despedem do sal.

Aquele lugar
Onde o meu silêncio conheceu o teu
E nunca se despediu.

Penso em mim, miúda ainda, transparente naquela sala de veludo pesado. Ouvir Chopin era bem melhor que derreter algodão doce na boca.
Estás sentado ao piano, pensativo, os teus olhos fitam por um momento um ponto invisível na parede branca. Um suspiro longo e os teus dedos ganham vida com a primeira nota.

Os teus dedos, pianista

Por dores ainda não tuas
Correm lentos e desamparados
Os teus dedos
Por lágrimas já minhas
Navegam rebeldes e incrédulos
Os teus dedos
Tão meus!

1 comentário:

semi lemon disse...

Estás de volta :) Lindíssimo!