sábado, maio 27, 2006

Nós

Perdi-me em ti.
Reencontrei-me em mim, em Nós.
Que infinita proximidade nos confunde?
Que vontade sedentária nos percorre?
Que sede me prova e em ti bebe?

Agarro os mundos da infinidade e as vontades da vontade.
Trespassamos o limite.
Sossegamos no conforto da unidade.
Que eu tão Nós.
Que plural tão singular.



Simplesmente para Nós.

sexta-feira, maio 26, 2006

A segunda história roubada

A praia está encoberta por um edifício de vidros baços. As minhas folhas estão encobertas por uma fina camada de falta de vontade. Ao longe, miúdos desafiam a gravidade equilibrados no vazio das ondas. Pego na primeira folha... as letras adensam-se perante a inércia leve do ar. Chopin... só uma vez prometo a mim mesma. Abro a caixinha de música e deixo o Nocturno nº 15 encostar-se à minha pele. Deixo-me levar pela brisa de maresia e sol para um outro lugar também leve, também meu.

Aquele lugar

Aquele lugar
Onde a alma se despede do corpo
E as lágrimas se despedem do sal.

Aquele lugar
Onde o meu silêncio conheceu o teu
E nunca se despediu.

Penso em mim, miúda ainda, transparente naquela sala de veludo pesado. Ouvir Chopin era bem melhor que derreter algodão doce na boca.
Estás sentado ao piano, pensativo, os teus olhos fitam por um momento um ponto invisível na parede branca. Um suspiro longo e os teus dedos ganham vida com a primeira nota.

Os teus dedos, pianista

Por dores ainda não tuas
Correm lentos e desamparados
Os teus dedos
Por lágrimas já minhas
Navegam rebeldes e incrédulos
Os teus dedos
Tão meus!

quinta-feira, maio 25, 2006

Abraço

Porque no teu abraço nasci.
Ali naquele instante cresci.
Crescemos.
Afastados de toda a insignificância,
invadidos pelos timbres sibilantes,
deixamos os passos.
Fitamo-los mais uma vez para ver se ficaram.
Queria ter a certeza que não se evaporavam
no recolher dos braços.

Ainda hoje vejo os nossos passos quando caminho
num abraço que perdura.

Limonada

Considerando que:

a) não há limonada sem limoas, lá diz a sabedoria popular,
b) eu sou só “meia”,
c) 1 semi-limoa + 1 semi-limoa = 1 limoa.

Digo de mim para comigo:

Mais vale uma semi na limonada que uma limoa inatingível no limoeiro.
Mais vale uma semi na limonada que uma limoa inatingível no limoeiro.
Mais vale uma semi na limonada que uma limoa inatingível no limoeiro.
Mais vale uma semi na limonada que uma limoa inatingível no limoeiro.
Mais vale uma semi no limonada que uma limoa inatingível no limoeiro.

(A repetição tem como único objectivo o auto-convencimento)

…..Ou então, tenta-se a cissiparidade para encontrar a outra metade.

São só números...

Contribuição para a estatística

“Em cada cem pessoas:

Sabendo tudo mais que os outros:
-cinquenta e duas,

inseguras de cada passo:
-quase todas as outras,

prontas a ajudar desde que isso não lhes tome muito tempo:
-quarenta e nove, o que já não é mau,

sempre boas porque incapazes de ser de outro modo:
-quatro, enfim talvez cinco,

prontas a admirar sem inveja:
-dezoito,

induzidas em erro por uma juventude, afinal tão efémera:
-mais ou menos sessenta,

com quem não se brinca:
-quarenta e quatro,

vivendo sempre angustiadas em relação a alguém ou a qualquer coisa:
-setenta e sete,

dotadas para serem felizes:
-no máximo vinte e tal,

inofensivas quando sozinhas, mas selvagens quando em multidão:
-isso, o melhor é não tentar saber mesmo aproximadamente,

prudentes depois do mal estar feito:
-não mais do que antes,

não pedindo nada da vida excepto coisas:
-trinta, mas preferia estar enganada,

encurvadas, sofridas, sem uma lanterna que lhes ilumine as trevas:
-mais tarde ou mais cedo, oitenta e três,

justas:
-pelo menos trinta e cinco, o que já não é mau,

mas se a isso juntamos o esforço de compreender:
-três,

dignas de compaixão:
-noventa e nove,

mortais:
-cem por cento, número que de momento, não é possível mudar.”

Wislawa Szymborska

sábado, maio 20, 2006

Escondidos

Hoje não queria começar com aquela lengalenga mecanizada e automatizada como cantiga de fundo de garrafa: doente sexo feminino X anos de idade com queixas de A, B e C…. Permitam-me ser diferente, só hoje.
Com a simpatia que deu de graça, sem eu pedir, sorriu. O seu metro e meio esguio balançava-se num roupão rosa claro, que nitidamente era muitos números acima da sua medida. A sua face colada aos ossos era marcada pelas rugas do tempo de sorrir, de olhar, de chorar. As suas mãos vencidas pela fraqueza da forma retraída, repousavam sobre o colo num descanso guerreiro intermitente que ressurgia para a luta perdida nos gestos contidos de exemplificação. Os seus olhos castanhos escuros estavam em mim. Aquele instante era nosso. Percebi que me levou o medo e restou a vontade de ouvir.
Seguiu-se o denominado exame físico. A simpatia permaneceu mas, agora a pessoa é um objecto. Um objecto. Como é ser um objecto? Assusta senhora professora? Desculpe!
A rotina.
Mãos e mãos vasculham e invadem o corpo fragilizado, entorpecido, desligado do ser…Tocam. Retocam. Aprofundam. Magoam.
Palavras imperceptíveis perfuram afiadas a ignorância.
Intimidades são roubadas.
Hábitos brancos desfilam.
Fugas subtis.
Desculpas circunstanciais.
Gestos perdidos.
Invasão sem permissão terminada.
Caminhamos agora, em passos que não mais acabam. Podemos fazê-lo para sempre? Mais um e outro e outro que se lhe segue até ao fim de linha. A pergunta é inevitável. A resposta é um vazio. Esconde a vontade de afagar e adiar a dor?
Esconde ou permite esconder-nos?

quarta-feira, maio 17, 2006

Equilíbrio?

"Nós temos cinco sentidos: são dois pares e meio de asas.

-Como quereis o equilíbrio?"

David Mourão-Ferreira

segunda-feira, maio 15, 2006

Fraude

Olhei-te mas, não te senti igual.
Senti-te menos meu.
Senti-te para lá do muro.
Pura aparição,
que um dia se tornou carne
e no outro se desfez em ilusão.

sábado, maio 13, 2006

E eles levam-nas nas cantigas


Os grilos são seres muito asseados que pertencem ao reino Animalia, filo Arthropoda, classe Insecta, ordem Orthoptera, subordem Ensifera e família Gryllidae (ufa! Até estou com dispneia...). São famosos pelo seu canto que é emitido pela fricção das asas entre si para acasalarem.
Ora aqui está, no seio do reino animal, em pleno séc. XXI, mais um caso de discriminação sexual... Nós, humanos, só nos interessamos pelos machos porque somente estes são capazes de produzirem som... As grilas, coitadas, como não cantam, resumem a sua existência a aumentar exponencialmente a curva demográfica dos ditos bichinhos... Freud, se se lembrasse de aplicar a sua famosa técnica de psicanálise nos grilos, certamente teria uma teoria para este facto e mais importante que isso: seria uma ajuda muito fantástica (onde é que eu já ouvi isto?!) às pobres Sras Donas Grilas... Elas, estão, neste momento, desesperadas a tentar perceber porque é que não conseguem ter sucesso no cruel mundo dos Humanos...
Caras amigas, não dá mesmo, é anatomicamente impossível... Mas há uma réstia de esperança! Eu, que sou leiga no assunto, aconselho a procurarem o Dr. Pascoamente, pois, de certeza que ele terá uma solução cirúrgica para tão ingrato problema... Estarão em boas mãos: será uma operação inédita em Portugal e feita pelo tal especialista! Melhor é impossível! Força amigas, Portugal está convosco!

quinta-feira, maio 11, 2006

Nome precisa-se!

Umas certas pessoas (ite + sees the light) ofereceram-me de prendinha um grilo! Sim um grilo! Acontece que temo que o bicho fique com uma crise de indentidade pois ainda não tem NOME.
Venho então, por este meio, pedir sugestões para apelidar o meu grilinho!
Para além de cantar desalmadamente o ser possuí uma antena maior que a outra (ainda por cima vem com defeito) se isto ajudar em alguma coisa....
Agradeço desde já!

terça-feira, maio 09, 2006

Parabéns Semi ;)


Cara Semi:

É por este meio tão erudito e tecnologicamente avançado que te vimos felicitar pelas 20 e algumas primaveras.
Gostaríamos muito de participar na tua festa mas como compreenderás, outros valores mais altos se “alevantam”: neste momento estamos na sala VIP do Aeroporto Francisco Sá Carneiro à espera de um voo para local incerto (por motivos de paparazzi, não podemos aqui publicamente revelá-lo). Espera-nos a muito óptima e muito fantástica festarola do nosso camarada e sempre amigo Bono (Bonoito para nós). Quem te mandou fazer anos no mesmo dia? Como estamos em semana de Queima, amanhã já nem te lembrarás que não fomos ao teu aniversário e nós também não faremos questão de te recordar!
Já que não somos forretas, tens aí 2 livritos escolhidos ao acaso por um assistente muito bem parecido e amanhado de uma tal FNAC (entenda-se: fine needle aspirative citology). Para adocicar as leituras, enviamos-te, em anexo, o teu Rodriguito. Aconselhamos-te viva, entusiasta e efusivamente a avaliares a glicemia capilar e a tensão arterial antes de começares o exercício entediante da inspecção, percussão, auscultação e o mais importante, a (a)palpação. Pratica bem porque vais precisar daqui a uns mesitos (em Barcelona ou num CEMEF qualquer)! Os exemplares é que poderão ser ligeiramente diferentes... Infelizmente não haverá nem toscanenses (suspira a (ite)), nem jogadores de futebol (suspira a Light) mas enfim, cá nos arranjaremos com uns barcelonenses ou, na pior das hipóteses, uns alentejanenses...
Encontrámos, numa visita à cidade das 7 colinas, um grilo perdido, carente de afecto, atenção e, quiçá, poesia. Pensamos logo em ti: a mãe de todos os grilos (mãe entre aspas- não queremos cá crises de Édipo)! Tens de lhe dar alface lavada da espécie Amoris loucus com calmex. Ah... canta que é uma maravilha e dança que faz até inveja ao Cortéz!
Acabaram de nos chamar para o voo... Bem, é uma grande chatice mas, ossos do ofício, lá vamos nós para a place called Vertigo!
Fica bem! Cuida das ovelhas e já agora aproveita e faz umas “soquettes” às riscas para o grilo que ele tem frio. Certo, grilo?
Das tuas mais que tudo Lemon(ite) e Lemon_sees_the_light.

PS.: Não te esqueças de apagar as velas dos “grofes” (diz a Light) e delicia-te com os anexos (diz a Ite)! Hasta la pasta!!!

segunda-feira, maio 08, 2006

Razões lógicas para se ser benfiquista

Meio mundo anda descontente já que nesta época, nas competições nacionais, o trajecto do Benfica foi um desastre. No entanto, esta fatalidade não retira prestígio ou grandiosidade ao clube. Para quem está aborrecido e chateado, aqui ficam algumas razões lógicas para se ser benfiquista:

  1. a razão natural: a mulher dá à luz, não dá ao dragão nem à alvalade;
  2. a razão bíblica: há uma passagem na bíblia que diz: "(...) domai os leões eos dragões e voarei no céu sobre as asas de uma águia (...)";
  3. a razão teológica: Jesus Cristo encarnou, não esverdeou nem sequer azulou;
  4. as razões futebolísticas:
  • o SLB é o segundo clube europeu com mais adeptos, só abaixo do Manchester United e à frente do Barcelona, Arsenal e Bayer de Munique (o FCP nem figura na lista!- porque será?);
  • conseguiu já 31 títulos de campeão nacional (o FCP tem 21 e o Sporting tem 18). A diferença é enorme!
Para quem tinha algumas dúvidas... acho que ficaram agora dissipadas!!!:)

domingo, maio 07, 2006

Mãe

Pequeno poema

“Quando eu nasci,
ficou tudo como estava.

Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve Estrelas a mais...
Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.

Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.

As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...

Pra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...”

Sebastião da Gama


Continuo a alimentar-me do teu olhar Mãe. Todo o meu amor.

sábado, maio 06, 2006

Insígnios Finalistas

Amores de Estudante

"São como as rosas de um dia
Os amores de um estudante
Que o vento logo levou.
Pétalas emurchecidas
Deixam no ar o perfume
De um sonho que se sonhou.

Capas negras de estudante,
São como asas de andorinha
Enquanto dura o Verão.
Palpitam sonhos distantes,
Alinhadas nos beirais
Do palácio da ilusão.

Quero
Ficar sempre estudante,
P'ra eternizar
A ilusão de um instante,
E sendo asim,
o meu sonho de amor
Será sempre rezado
Baixinho dentro de mim.

Os amores de um estudante
São frágeis ondas do mar,
Que os ventos logo varreram.
Pairam na vida uns instantes
Logo descem, depois morrem
Mal se sabe se nasceram

Mocidade, oh! mocidade
Louca, ingénua e generosa
E faminta de ilusão
Que nunca sabe os motivos
De quanto queira o capricho
Ou lhe diga o coração."

E de repente tudo passou, restam as memórias e a saudade. Calam-se os «a fe re ás» e deixamo-nos embalar pelas guitarras do primeiro fado. 00:01 minutos...as fitas são muito curtas para tantas histórias. A todos os finalistas, que a última Queima seja perfeita!

Reles Caloiros, Ignorantes Bestas

"Sou caloiro de Medicina,
Sou pujante, sou valente,
O melhor da Academia!

S. João é minha casa,
O inferno é Anatomia
E a praxe é do caraças!

Nossa cor é o amarelo,
Que ilumina as nossas vidas,
No sexo e nas bebidas!

No cortejo os primeiros,
Nas festas pioneiros,
E na Queima javardeiros!"

A todos os caros colegas do primeiro ano pela primeira vez uma semana de Queima inesquecível! ;)

sexta-feira, maio 05, 2006

Adubo precisa-se

Segundo a minha bola de cristal (e a imprensa desportiva também), o PSV Eindhoven está mesmo interessado no adubo holandês usado esta época nos nossos limoeiros. Desta forma, será necessário arranjar um novo pesticida para o pomar. O adubo escolhido terá de possuir estes requisitos mínimos obrigatórios:

  1. eliminar com eficácia as espécies Porthis citricola e Sportinghis citricola, protegendo todos os limoeiros de possíveis ataques;

  2. neutralizar toda a concorrência europeia;

  3. criar as condições ideais para os limoeiros florescerem e darem frutos;

  4. incentivar os limoeiros a quererem sempre mais e a fazerem sempre melhor.


Quem reunir todas estas exigências e achar que tem potencialidades para se tornar um bom adubo em campos lusitanos, deverá dirigir-se ao Pomar, em Lisboa.
Em breve, nos jornais, haverão novidades.

PS.: No curriculum vitae deverão estar especificadas as espécies de pulgões que cada um já conseguiu eliminar.

quinta-feira, maio 04, 2006

Pois, se calhar...


Se calhar...
Até nem quero!

Preciso de amarras
Gravidade
Linhas arquitectadas

Liberdade?!

Se calhar...
Até nem quero!

(Há dias assim, em que até o ar asfixia... venham lá os gofres!)

terça-feira, maio 02, 2006

Sul

"It's time to go again
To your blue room
Got some questions to ask of you
In your blue room
The air is clean
Your skin is clear
I've had enough of
hanging round here
It's a different kind of conversation
In your blue room"

Passengers, Your Blue Room


Quando a neblina se tingiu de azul
E os pássaros voaram para o sul
Pensei em ti

É na penumbra das palavras que te escondes
Mas é sempre em silêncio que te denuncias
Há janelas indiscretas nos ângulos dos teus versos
Equilíbrios improváveis de luzes que chovem e águas que iluminam
É inútil diluíres-te na imensidão submersa de qualquer lugar
Há demasiada singularidade em ti…

Quando a neblina se tingiu de azul
E os pássaros voaram para o sul
Reconheci-me em ti.


Para o Tiago, o poeta do sul, em jeito de agradecimento pela “Manhã de Guerra” (albertovelasquez.blogspot.com).